Passa algum tempo que tenho estado a envergonhar-me com algumas situações que os factos testemunham com maior ou menor regularidade, mas pelo menos com alguma tendência para ser moda. São as atitudes dos meus compatriotas, os moçambicanos deste país que já tem merecido algum apreço de seus cidadãos verdadeiramente moçambicanos que o chamam de “pátria amada”.
Numa tentativa de se perdoar face ao último incêndio que deitou abaixo todo um esforço nacional de erguer o edifício que “em vida” respondia por Ministério de Agricultura, o executivo de Moçambique acaba de atribuir 13 milhões de meticais ao Serviço Nacional de Bombeiros para serem aplicados na aquisição de viaturas “extintoras de incêndios”. Uma decisão acertada mas, tardia e inocente dos seus mentores. Pois é não era necessário esperar por uma desgraça para se decidir nesse sentido.
Não quero calcular o custo de um ministério, só o seu edifício, para depois comparar com o custo de duas viaturas para combater incêndios. Foram destruídos equipamentos, documentos importantíssimos, mobiliários sem falar de anos e anos de arquivos guardados naqueles departamentos e direcções nacionais, cujo valor supera todas as contas de investimento no Serviço Nacional de Bombeiros. A questão é que neste país temos estado a agir “depois de burro morto”. Senão vejamos:
São muitas escolas de Rovuma ao Maputo que estão a degradar-se a vista de seus responsáveis, mas estes ficam a espera da queda da última parede para merecerem um fundo para reconstrução no lugar de um fundo para manutenção. O argumento é, não há fundo para manutenção. Só depois de o tecto desabar sobre os alunos, aí já temos dinheiro para reconstruir.
As estradas deste país começam a esburacar-se lentamente sem ninguém se dar conta disso, talvez porque os chefes passam por aí ocasionalmente e, mesmo assim, passam no maior dos confortos que o nosso país possui. Mais tarde a situação é inversa, é um pouco de estrada entre os buracos. O argumento é, não há fundo para manutenção. Coitadinhos os transportadores de passageiros e de carga que não estão isentos de pagar o imposto de circulação e têm que fazer manutenção de seus carros. Quando os acidentes começam a avolumar-se já temos dinheiro para a reconstrução.
Nossos jornais reportam sempre situações de negligência propositada para se merecer um bolo de reconstrução maior do que o bolo de manutenção. As nossas pontes cais entre Maxixe e Inhambane são mais um exemplo dessa lamúria triste realidade. Agora sim, temos fundos para reconstruir...
Antes do dia 22 de Março neste país não havia fundo para cuidar dos paióis mas quando as explosões de 22 de Março no paiol de Malhazine foram severamente trágicas, o governo decidiu finalmente desactivá-lo e houve fundo para desactivar todos os paióis nacionais e destruir o material obsoleto.
Lembro-me de meus irmãos vulgarmente conhecidos por “Magerimanas” que foram pelo caminho de rebeldia para poderem receber o que lhes era devido e que até aquela altura não passava de um falso argumento para justificar a burla. Em fim, depois de tanta falta de fundos, finalmente houve fundos. Espero que não voltem a manifestar-se defronte ao ministério da minha senhora na 24 de Julho.
As nossas cidades andam vulneráveis a incêndios, lembrei-me do incêndio que consumiu o mercado em Homoine no ano transacto, e num futuro que não tarda muito teremos outro incêndio noutro lugar diferente de Maputo onde não há Mozal nem LAM ou Aeroportos de Moçambique que ajudaram os serviços de bombeiros a acabar com as chamas do ministério. Não sei se vai ser uma barraca ou uma Direcção Provincial que vai arder. O certo é que tudo vai ficar em cinzas. Para quê se preocupar com isso? Se não vai faltar dinheiro para construir uma nova direcção provincial. Está a faltar é o fundo para cada cidade ter um serviço de bombeiros.
As decisões devem ser tomadas na hora exacta e a tempo de serem úteis para evitar-se o pior. E nada de improvisos só para sermos peritos nesta matéria de improvisar.
Alguém se esqueceu de gerir razoavelmente as águas de Cahora Bassa e tentou evitar a desgraça da destruição da barragem trazendo a desgraça das cheias no Zambeze que também viraram moda anual. Afinal para quê que servem as comportas de uma barragem tão enorme como Cahora Bassa? Um bom sistema de gestão de água podia ter evitado o que não foi possível evitar, e isso envergonha-me quando se trata da maior empresa nacional a não conseguir criar um sistema eficaz de gestão. Valeu a pena, pelo menos criou-se uma oportunidade de se gastar o dinheiro que não existe e surgiu mais um bairro de refugiados ambientais, uma nova forma de aldeamentos que tanto foram combatidos pelo “meu irmão líder e o seu movimento, o da perdiz”.
Temos problemas de planeamento nas nossas cidades e municípios, recordemos os casos recentes de maré-gigante que assolou casas no Bairro dos Pescadores em Maputo e algures na cidade da Beira. Agora não há fundos para tomar-se medidas certas e sem custos elevados, mas qualquer dia teremos dinheiro para isso e vai dar para obras de vulto que pelo menos contribuirão para a riqueza absoluta dos que podem participar activamente na construção dos famosos bairros de refugiados ambientais em Moçambique. Até porque têm nomes interessantes: Matendene, Zimpeto, Ndambine 2000, Bawe, etc. etc.
Temos que agradecer decisões acertadas como aquela que o Conselho Municipal de Pemba teve ao mandar demolir murros que eram autentica violação à estética da paisagem linda que a praia oferece aos munícipes e visitantes. Mas não vamos esperar que se gaste tanto para depois mandar-mos destruir ou corrigir. Ou seja, temos que aprender dos nossos erros mas não temos o direito de errar com o propósito de aprender. Vamos fiscalizar o nosso trabalho.
Sabe-se que um dirigente quando não serve ao público deve ser retirado e em seu lugar colocar outro que possa servir, mas os moçambicanos ficam a espera de não sei o quê, para retirar um chefe que já destruiu tudo e extorquir tudo o que havia por roubar. Talvez tenhamos um patrão para nomear ou exonerar os chefes. “Afinal quem é o chefe?”
A cultura do “deixa andar” é mesmo dos moçambicanos, mesmo quando estão perante um perigo eminente. A razão que serve de guarda-chuva é sempre a mesma, não há fundos, e fica-se a espera que alguma coisa afunde para haver fundos que também não sabemos de onde vêm. Em fim, talvez os economistas e gestores conheçam melhor a matéria de fundos. Eu não sei nada de fundos, por isso que estou a afundar-me nestas palavras a procura de um fundo que nem sei se existe.Sei lá, não há fundos para eu publicar esta opinião que me veio da patavina. Mas algum dia teremos fundos para publicar todas as cartas que andam arquivadas nas gavetas da consciência de cada moçambicanos.